quarta-feira, 30 de março de 2011

Coração na intempérie, perigo. Voo com asas de papel. Me entreguei sem sorte e sem arte à tempestade que me prendeu e afastou.
Rosa dos ventos que não me aponta o norte. Sempre fui dos inversos, a que escreve versos e que não os compartilha com ninguém. Minhas letras morrem no tecido.

Depois de mim, virá quem?

quarta-feira, 23 de março de 2011

As próprias imagens... inconsciente coletivo pra mim é individual, quase próprio. Assim que eu me sinto diferente de tudo. Incomodar como um cisco no olho, doer como bater o pé na quina. São meus métodos. Não sou nem nunca fui a natureza inteira. Me são podadas as folhas, me são retiradas as raízes. Meu trem sai amanhã às 7h. Você quer que eu fique? Eu sou só caule, sem flor. Sem o que fui ou serei. Já nem sei mais onde está o bilhete. Vem que hoje eu sonhei contigo e você me pediu pra ficar, mesmo eu sendo essa planta tão engraçada.
Se sou complexa, sou: A loucura é linda - está escrito no muro da avenida de casa e eu acredito. Lucidez é uma promessa vã e eu também nem quero. Gotas de suor, gotas de orvalho, choro. Complexos talvez sejam os outros. Complexa é a água. Eu sou o grão. O vento lambendo faces de gente anônima, Guarda chuva, céu bicolor. Sempre gostei de formar frases, sempre gostei de mãos sujas de tinta. Complexa é a água que fica colorida ou não. É simples, é simples, levar tudo embora.
Relações intrínsecas, indivisíveis. Não são meus cabelos, não é a cor deles, não sou eu como fruta madura caída no chão, esperando o recolher. Ou o apodrecer para florir de novo - mais limpa? Lá em casa eu sou o fruto que caiu. E as janelas abertas me iluminam.
Uns amigos, algumas páginas, o nada. Papéis gastos, cartazes e uma fachada. Que não é nada. Uns tantos abraços, uns tantos bilhetes, a vida parada. No nada.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Um copo quebrado
um copo quebrado espatifado no chão.
A sujeira pode ser limpada
o ferimento não.
Ferimento interno
não tem cura.
Agora que vivi dá pra imaginar
como se fosse você que estava lá.

Agora que vivi consigo recriar
consigo imaginar e arquitetar novas ações
e é sempre do teu lado
sempre no escuro
pra que não nos notem
como se aquilo nem estivesse acontecendo
acontece e morre no mesmo instante
sem marcas.
Nada.

Pra evitar olhares
estrangeiros e próprios
sempre escuro pra fingir que não é nada
quando é tudo
longe de todos
e de nós mesmos
do que somos
quando não vivemos.
Do que somos
no de fora do que é nosso
no de fora do que somos nós dois juntos
na vida separada
quando a vida conjunta é secreta.
Longe do que a gente conhece
dos valores que defende
e eu ignoro.
Da vida que você escolheu por prazer
e eu por obrigação.
Mas somos fomos juntos
estamos.
Sem nada
a não ser umas mãos
e dois corpos
e olhos
e essa coisa que não é palpável
mas quase vejo
essa coisa que não tem nome
mas quase sinto.
Que só se mostra se os olhos mundanos estiverem fechados
só se mostra longe do habitual
só se deixármos o que somos pra trás
o que defendemos
o que fingimos ser
pra viver
e acordar
pro
amor.
Pra nós dois.

Manter os olhos fixados
só assim passamos a ser um conjunto de olhos
artérias e veias
e sangue
sangue quente
e mãos e dedos
sincronizados.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Que horas são?
Como é que se diz amor
pelos poros?
Como é que anda?
Como é que passa pra você?
Quando?
Quem foi que disse que amor se diz?
Quem foi que disse amor pela primeira vez?
E quem dirá pela última?
Quem foi, pela primeira vez, o amor?
De alguém ou meu
O algo que falta?
Quem fez falta ao primeiro ser humano?
Como é que se chama saudade?

...

Como é que se medem as horas?
Como é que se mata o tempo?
Como é que se trai o amor?

Quem disse saudades pela primeira vez?
Quem a definiu?
Quem criou a palavra dita?
E a não dita?
Pra onde vão as palavras não ditas?
Onde se escondem quando não querem sair?
Onde se armazenam?
Como é que a gente as recupera?
Como é que a gente se recupera?
Se perdendo pra encontrar?

Por que o silêncio de dentro é insuportável?
Loucura é lucidez fluida
Lucidez translúcida
Qual é o cheiro de terra?
De onde vem?
Da loucura que flui?
Do poro da pele?
O que é essa coisa de dentro
que se repete no de fora?
Que é essa coisa pequena
e quase invisível?
O universo?
Sou eu?
O universo sou eu?
Não sou inteira
nem a metade
não sou contável
nem o universo.
Não sou notada
eu vim da terra da Terra
Meu cheiro é da terra
meu cheiro é de terra
É meu.