domingo, 5 de agosto de 2012

Era dessas mulheres que queriam tudo da vida. Em uma das habituais noites em que andava por aí com sua inseparável jaqueta de couro e suas infinitas correntes e alfinetes – que nada mais eram do que seu modo particular de dizer que qualquer aproximação desnecessária seria seguida de morte lenta e dolorosa – o encontrou. O relógio do pulso de um estranho marcava 3h da manhã e ela o viu na entrada de um clube noturno com um beijo em neon vermelho. Os faróis dos carros refletiam no rosto daquele rapaz, deixando-o tentador.

Ao se aproximar lentamente, analisou os gestos, planejando seus atos. Ofereceu a ele tudo o que tinha em troca de apenas uma noite. Mesmo que tudo o que tinha não fosse seu. Tábata, era esse seu nome, era vista pelos outros como uma encrenqueira que vivia à margem de tudo. Não tinha emprego fixo, nem nada que fosse possível usar essa palavra. O dinheiro com que pagaria o rapaz pela noite, conseguiu roubando dos casacos deixados por senhores e senhoras da alta sociedade para que ela guardasse ao entrar em restaurantes chiques. Eram tão ricos e estúpidos, ela dizia, que não reparariam no sumiço de 500 dólares, de um cartão de crédito ou mesmo da foto 3x4 de algum familiar da carteira. Nada importava. Era só conseguir outros.

Ele aceitara a oferta. Tábata não fazia perguntas, mal falava. Não estava interessada em saber nada sobre ninguém mas se viu tentada a perguntar o nome daquele estranho de sorriso bobo. “Marco Antônio” - obteve como resposta e não pôde sentir se ele a estava enganando ou não. Respondeu, sincera, como se chamava e foi surpreendida com um riso frouxo do outro que lhe disse:

-Tábata, a Gazela, nome muito incomum para uma mulher que aparenta ser devoradora como você, não acha? É um cordeiro em pele de lobo.

Viveram juntos por anos e anos. O único objeto que possuía era uma caixa de madeira, indiana, comprada com seu próprio dinheiro, contrariando tudo o que pensava sobre isso. Guardara um pedaço da camiseta dele que rasgou na primeira noite e em todas as outras. Seus bilhetes, os fósforos que acendiam os cigarros de ambos, um vidro com sangue, alguns dentes.

Quando soube da morte de Marco, Tábata entrou em uma daquelas crises que a acompanhavam. Entretanto, sabia que não conseguiria quem a tirasse daquele estado.

No mesmo dia, horas depois, seu corpo foi encontrado no lago do Parque Ibirapuera. Vestida com sua jaqueta de couro surrada, trazia no dedo médio da mão esquerda uma fita de cetim preta, nos braços, a caixa de madeira e nos bolsos do casaco, pedras de tamanhos diversos recolhidas de todos os lugares que os dois já estiveram e prometeram incendiar juntos.

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